1968 28 de março

'Mataram um estudante. Podia ser seu filho'

Assassinato de Edson Luís pela PM do Rio detona onda nacional de protestos

Um tenente da Polícia Militar mata com um tiro o estudante secundarista Edson Luís de Lima Souto, de 17 anos. O crime foi cometido durante invasão policial ao restaurante estudantil Calabouço, no Rio, onde estudantes protestavam contra a má qualidade da comida. Outros seis jovens foram baleados. A violência policial desencadeou uma onda nacional de atos contra a ditadura, que contaram com forte apoio da classe média. O enterro de Edson Luís marcou o início da ascensão do movimento estudantil no país, que iria culminar na Passeata dos Cem Mil, em 26 de junho.

Em 28 de março, por volta das 18h, a PM dispersou uma manifestação que pretendia alcançar o prédio da Assembleia Legislativa. Os estudantes se abrigaram dentro do restaurante. Às 18h30, o tenente Aloísio Raposo comandou a invasão. Deu ordens para “quebrar tudo” e atirou à queima-roupa no peito de Edson Luís. Os jovens reagiram com paus e pedras, fazendo a polícia recuar. Para impedir que a PM desaparecesse com o corpo no Instituto Médico Legal, os estudantes o carregaram nos braços até a Assembleia, onde dois médicos realizaram a autopsia. Coberto com a bandeira do Brasil e com cartazes de protesto, o corpo de Edson Luís foi velado no saguão do prédio.

No fim da tarde de 29 de março, cerca de 50 mil pessoas acompanharam o cortejo fúnebre até o cemitério em Botafogo, onde Edson Luís foi enterrado ao som do Hino Nacional e aos brados de “Mataram um estudante. Podia ser seu filho”. Naquele dia, houve manifestações de protesto contra a ditadura e greve geral de estudantes em todo o país.

O Rio praticamente parou no dia do sepultamento. Os espetáculos de teatro foram suspensos em solidariedade por parte dos artistas. Numa alusão à violência, os letreiros da Cinelândia exibiam os títulos de três filmes: “A Noite dos Generais”, “À Queima-Roupa” e “Coração de Luto”. Cartazes e pichações continham frases como “Os velhos no poder, os jovens no caixão”, “Bala mata fome?” e “Abaixo a ditadura”. 

A mobilização e os protestos continuaram ao longo da semana. Na manhã de 4 de abril foi celebrada missa de sétimo dia por Edson Luís na Candelária. Na saída da igreja, as pessoas foram cercadas e atacadas a golpes de sabre pela cavalaria da Polícia Militar. O governo proibiu a celebração de outra missa, à noite, mas a determinação foi ignorada pelo vigário-geral do Rio, dom Castro Pinto. Um cordão de religiosos se postou à entrada da igreja, para evitar novo massacre, mas as 600 pessoas que deixaram a Candelária foram perseguidas pelas ruas e atacadas pela PM e por tropas do Exército e da Marinha.

Edson Luís, que era filho de uma família humilde de Belém do Pará, trabalhava para custear os estudos no Rio quando foi vítima da violência policial. Tornou-se um símbolo do movimento estudantil e da luta pela democracia no país. Em sua memória e de seus companheiros de luta, foram compostas pelo menos duas belas canções: "Calabouço", de Sérgio Ricardo, e "Menino", de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos.