1975 25 de outubro

Vladimir Herzog é assassinado no doi-codi

Jornalista morre sob tortura, polícia monta farsa e 8 mil fazem protesto na Sé

O jornalista Vladimir Herzog é torturado e morto nas dependências do DOI-Codi. Ele havia sido convocado na véspera a prestar depoimento, em mais uma etapa da ofensiva da repressão contra o PCB desencadeada em janeiro de 1974. 

Herzog era diretor de jornalismo da TV Cultura, vinculada ao governo do Estado de São Paulo. Sua ida à polícia naquele dia era do conhecimento da família e de outros diretores da emissora. Sua estada no DOI-Codi foi testemunhada pelos também jornalistas George Duque Estrada, Rodolfo Konder e Paulo Markun. Eles estavam presos e ouviram os interrogadores de Herzog pedirem a máquina de choques. O jornalista chegara ao departamento na manhã daquele sábado e no começo da tarde já estava morto. 

Os militares não tinham como esconder a morte e criaram a versão de suicídio por enforcamento. Herzog teria usado o cinto de pano do macacão de preso, segundo a polícia. Uma fotografia grotesca foi distribuída à imprensa. Mostrava o corpo do jornalista, de joelhos dobrados, com a cabeça pendida para a direita e o pescoço atado por uma tira de pano à grade da cela. A distância do chão até a grade era de 1,63m. O macacão dos presos não tinha cinto. Era uma cena claramente montada. A farsa do suicídio foi oficializada em autópsia do legista Harry Shibata. Somente em 2003, a viúva Clarice Herzog receberia o atestado com as causas reais da morte: “lesões e maus tratos sofridos durante interrogatório em dependência do 2° Exército”. 

A morte do jornalista e a versão do suicídio provocaram uma onda de indignação sem precedentes. O assassinato coincidia com uma greve estudantil, também de proporções inéditas, na Universidade de São Paulo (USP), na Pontifícia Universidade Católica (PUC) e na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Em assembleia, o Sindicato dos Jornalistas convocou um ato religioso em memória de Herzog.

A cerimônia foi realizada em 31 de outubro na Catedral da Sé, com a presença dos cardeais Paulo Evaristo Arns e Helder Câmara, do rabino Henry Sobel e do reverendo James Wright, entre outros celebrantes. O ato atraiu cerca de 8 mil pessoas dentro da catedral e nas imediações. O secretário de Segurança Pública, coronel Erasmo Dias, bloqueou ruas de acesso e montou um grande cerco em torno da praça da Sé, com cavalarianos e cães policiais, para evitar que estudantes e jornalistas saíssem em passeata. Apesar da repressão, a celebração transformou-se na primeira grande manifestação pública contra a ditadura desde 1968. 

O assassinato do jornalista elevou também a tensão dentro do governo. O general presidente Geisel teria entendido o episódio como uma provocação da chamada “linha dura” contra o projeto de “distensão”. O comandante do 2° Exército, general Ednardo D’Ávila Mello, era aliado do ministro do Exército, general Sylvio Frota, candidato à sucessão de Geisel. Mas ainda haveria de morrer mais um preso no DOI-Codi, em janeiro do ano seguinte, para forçar uma reação do general presidente contra os “duros” do aparelho de repressão.